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Regulamentações do crédito e impactos para o Brasil na OCDE [Reis Advogados]
Vários fatores são determinantes para o bom desenvolvimento econômico de um país e,
sem dúvida, a regulação jurídica aplicável ao mercado de crédito é um dos pilares
fundamentais.
Quando se direciona o foco ao mercado de crédito brasileiro muito se debate ainda sobre
sua precificação, devido aos altos juros cobrados em vários tipos de operação. Contudo,
dentre os diversos componentes que compõem esses custos, dois merecem destaque em
nossa análise. Um é o risco de inadimplência e o outro o custo operacional. Dois itens
cruciais em nosso País.
Isto porque a correlação da inadimplência e a precificação dos juros têm papel
fundamental no desenvolvimento econômico, inclusive sob o viés de investimentos
externos. Em síntese, quanto maior o risco da inadimplência maior será o efeito na taxa
de juros cobrada. Muito deste risco pode ser mitigado na medida em que se atrela uma
garantia à operação de crédito, que deve se revestir de boa liquidez e, ao mesmo tempo,
em um cenário de forte segurança jurídica e celeridade necessárias para a recuperação do
bem (móvel ou imóvel).
Na outra ponta temos a necessidade permanente de redução do custo operacional,
intrinsicamente ligada à viabilidade – prática e jurídica – de implantação de alternativas
seguras que reduzam os custos de tempo e burocracia sem que haja impacto na qualidade
do produto e/ou serviço entregue ao cliente, seja ele pessoa física ou jurídica.
Obviamente, ambos passam por um movimento forte de investimentos em educação
financeira da população.
Em janeiro deste ano o Conselho da Organização para Cooperação e Desenvolvimento
Econômico (OCDE) abriu formalmente as discussões para acesso do Brasil, sendo que já
houve aprovação do Roadmap estabelecendo os termos, condições e como será o processo
de adesão.
Se aprovado, o ingresso do Brasil à OCDE traz diversos benefícios como o aumento do
intercâmbio e cooperação com economias mais desenvolvidas e, principalmente, estimula
a adoção de práticas positivas em relação à gestão econômica e social.
O caminho para o efetivo ingresso na OCDE ainda é longo, porém alterações regulatórias
que impactem positivamente em desburocratização, segurança jurídica e no mercado de
crédito, desenvolvimento econômico e que culmine no fortalecimento e desenvolvimento
do controle das finanças pelos tomadores de crédito são bem-vindas em qualquer
contexto, especialmente após um período de pandemia e desafios econômicos.
Esses instrumentos vêm se aperfeiçoando nos últimos anos no Brasil, mas ainda não são
de todo adequados. Neste viés, alterações na legislação brasileira têm trazido impactos
extremamente positivos para o impulso e a retomada de desenvolvimento econômico,
com destaque para a Lei 14.382/22 e para o Projeto de Lei 4.188/21 :
Lei 14.382/22
Trouxe impactos práticos no dia-a-dia da contratação do crédito e na redução do custo
operacional na medida em que o vai e vem de documentos, reconhecimento de firmas,
busca de certidões e de outros documentos públicos necessários para a contratação
exigem do tomador e do concedente do crédito uma peregrinação pelos diversos cartórios,
grande dispêndio de tempo e, não raras vezes, interpretações legais diferentes entre as
serventias. São antigos gargalos operacionais e componentes consideráveis na
precificação do produto/serviço de crédito oferecido em razão de toda a infraestrutura
operacional necessária.
Neste aspecto, a implantação e funcionamento do Sistema Eletrônico dos Registros
Públicos (SERP), viabilizando o registro dos atos e negócios jurídicos, a recepção e envio
de documentos e títulos, a expedição de certidões e a prestação de informações por meio
eletrônico e de forma centralizada em conjunto com o atendimento remoto se traduz em
um ganho absurdo de tempo em toda a dinâmica de contratação.
Ainda nessa linha destaca-se a autorização para que os registros e averbações dos fatos,
atos e negócios jurídicos sejam recebidos pelos oficiais de registros públicos, quando
cabível, por meio de extrato eletrônico – cuja definição será disciplinada pela
Corregedoria Nacional de Justiça.
A consulta centralizada a respeito das informações de indisponibilidades, restrições e
gravames existentes no bem objeto da garantia, bem como de informações importantes
acerca do tomador do crédito ou terceiro garantidor agilizam sobremaneira as avaliações
necessárias para prosseguimento da operação e risco na recuperação do crédito.
A norma traz a possibilidade de arquivamento da íntegra do instrumento contratual que
pode vir a ser uma possibilidade de redução de custo operacional de guarda de
documentos em situações específicas, desde que observados o quanto disposto no artigo
127-A incluído na Lei de Registros Públicos.
As medidas acima possibilitam ainda mais a utilização dos sistemas de inteligência
artificial para obtenção de documentos, agilização na análise de informações e até mesmo
na emissão do contrato, assinatura, averbação e registro contratual.
Aliás, especificamente neste ponto, seria excelente que se trabalhasse em um modelo
unificado de matrícula e de outros documentos que representem o registro e/ou
averbação de atos jurídicos, bem como formato de emissão de certidões – inclusive e,
principalmente, a forma de disposição de seu conteúdo. A leitura desses documentos por
meio da inteligência artificial seria mais uma etapa no avanço deste mercado.
Autorizar integrantes do mercado financeiro – observados os requisitos contidos nos
parágrafos 4º e 5º, incluído ao artigo 206-A – a efetuar o pagamento dos atos pertinentes
à vista de fatura é mais uma das benesses trazidas para o dia a dia da operação.
Por fim, e não menos importante, a equiparação dos prazos ao já estabelecido na
legislação processual, assim como a definição de prazos para emissão de certidões,
registros de documentos e devolução de exigências são aspectos muito positivos.
Projeto de Lei 4.188/21
Em tramitação, mas já aprovado na Câmara dos Deputados. Dispõe sobre o serviço de
gestão especializada e o aprimoramento das regras de garantia que, se aprovado,
consolidará o cenário favorável à ampliação de acesso à crédito mais barato no País.
Destacam-se três grandes inovações:
(1) cria as Instituições Gestoras de Garantias (IGG), possibilitando o melhor
aproveitamento de bens – móveis e imóveis – como garantia a operações de crédito. O
modus operandi e limitações legais atualmente impossibilitam que um bem seja
integralmente utilizado em garantia de duas ou mais operações, fazendo com que exista
uma ineficiência e um aumento no custo do crédito pela ociosidade de parte do valor
deste móvel ou imóvel. Exemplo: um imóvel no valor de R$ 1 milhão utilizado como
garantia a uma dívida de R$ 200 mil. A diferença entre tais montantes não é utilizada em
garantia de outros créditos. O Projeto de Lei altera esta dinâmica na medida em que prevê
a inversão do modus operandi de concessão de garantia. Aquele que pretende tomar
crédito poderá registrar seu bem na IGG de sua escolha que, por sua vez, procederá com a
avaliação deste bem, controlando os limites alocados em cada uma das operações de
crédito e com isso gerenciará a melhor utilização do montante total. Isso gera eficiência
na concessão do crédito, redução de custo operacional e impacto de inadimplência, assim
como agilizará a retomada da garantia e retorno do valor emprestado.
(2) busca e apreensão extrajudicial de bens móveis, aumentando sobremaneira a
celeridade na retomada da garantia, tal qual observado no procedimento previsto na Lei
9.514/97 aplicável a bens imóveis;
(3) o fim da exclusividade da Caixa Econômica Federal (CEF) em relação ao penhor civil,
permitindo com que outros players atuem com tal espécie de garantia.
Essas duas medidas, além de outras previsões contidas no Projeto de Lei, fortalecem o
sistema de garantias no Brasil e possibilitam, como dito antes, a redução do custo
operacional e do índice de inadimplência.
De acordo com o Chefe da Assessoria Especial de Estudos Econômicos do Ministério da
Economia, Adolfo Sachsida, a implementação de tais modificações tem o potencial de
destravar mais de R$ 1 trilhão nos mercados de capitais, garantias e crédito, beneficiando
pequenas empresas, o agronegócio e a família brasileira.
As alterações trazidas pela Lei 14.322/22 e as previstas no Projeto de Lei 4.188/21
traduzem-se em fatores importantíssimos de segurança jurídica, permitindo que o Brasil
se torne mais competitivo para o investimento estrangeiro. Isso, por sua vez, propicia o
crescimento econômico sustentável, maior geração de emprego e desenvolvimento social,
temas que são relevantes para a OCDE e que impactam na análise para o ingresso do
Brasil na Organização.
*Daniela Veltri, especialista em Direito Imobiliário e gerente jurídica do
escritório Reis Advogados (SP)
Fonte: Estadão
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