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Brasileiros buscam cursos profissionalizantes em Portugal [Clube do Passaporte]
Lisboa — Há pouco mais de um ano e meio, a niteroiense Mariana Nogueira, 24 anos, decidiu dar um novo rumo na sua vida profissional. Formada em técnica de hotelaria, ramo no qual trabalhou por cinco anos, viu na mudança para Portugal uma oportunidade de abrir novos horizontes e, melhor, internacionalizar sua carreira. Em vez de uma pós-graduação ou um mestrado, o caminho escolhido por ela foi um curso profissionalizante, uma tradição em território luso entre aqueles que querem sair das salas de aula direto para o mercado de trabalho. “Estou muito animada com essa transição”, afirma.
Os cursos profissionalizantes estão espalhados por várias regiões de Portugal e se tornaram uma das principais opções para brasileiros que desejam viver legalmente no país europeu. Pela legislação portuguesa, todos os alunos que se matricularem em cursos com duração de um ano ou mais têm direito a vistos de residência e de trabalho. “A partir do momento em que a matrícula é feita, a escola emite uma declaração. Quem está no Brasil, por exemplo, apresenta o documento ao consulado português no país. Os que já estão em Portugal, entregam o comprovante ao serviço de imigração, que confirma a veracidade com o colégio”, explica Karol Ximenes, CEO da Rotunda Academy, consultoria especializada nesse mercado.
As opções de cursos profissionalizantes são muitas, acrescenta Karol, passando de uma centena. Ela ressalta que todas as escolas que oferecem esse tipo de formação passam por uma rigorosa fiscalização da Direção-Geral do Emprego e das Relações do Trabalho (Dgert), órgão vinculado ao Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social. Os colégios também passam pelo controle do Ministério da Educação. “É uma forma de garantir a todos que, além de uma boa formação profissional, estão dentro de um ambiente seguro e reconhecido pelo governo”, frisa a executiva. Não sem razão. Na terra sem lei da internet, se oferece de tudo, e tem sido uma constante pessoas caindo em golpes.
Diretora da Academia e-Futuro, uma das escolas mais procuradas por brasileiros, Renata Maida Freire reforça a preocupação das autoridades com a qualidade dos cursos profissionalizantes. “Cada curso tem de ser certificado pela Dgert. São avaliados os conteúdos das aulas, inclusive as práticas, e as instalações das escolas”, explica. Essas avaliações são periódicas e os alunos, para obterem o diploma, devem ter, no mínimo, 70% de acerto nos testes. Tanta preocupação, acredita Renata, tem a ver com a necessidade de se colocar bons profissionais no mercado. Há áreas muito específicas, como a de saúde, que requer cuidados. Os cursos custam entre R$ 4.500 e R$ 5.200.
Alta empregabilidade
Tanto Karol quanto a diretora da Academia e-Futuro chamam a atenção para o elevado nível de empregabilidade dos cursos profissionalizantes em Portugal. Em média, sete em cada 10 estudantes já saem com emprego garantido, mas, em determinadas disciplinas, a empregabilidade chega a 90%. Isso ocorre, sobretudo, porque os colégios que oferecem esse tipo de formação são obrigados a garantir estágios aos estudantes. Assim, há uma forte conexão entre os formadores de mão de obra e aqueles que estão precisando de profissionais. “Todos sabem que há falta mão de obra em vários setores da economia portuguesa, então, aqueles que se destacam nos estágios têm muita chance de serem contratados”, assinala a CEO da Rotunda Academy.
A mesma avaliação é feita pelo advogado Fábio Pimentel, do escritório Pimentel Aniceto, especializado em imigração. “Os cursos profissionalizantes são um caminho mais curto para a regularização jurídica e civil em Portugal. A partir do momento em que as pessoas conseguem um emprego, passam a contribuir para a Segurança Social (Previdência portuguesa), podem ter conta bancária e conquistam condições financeiras para alugar um imóvel”, explica. Ele lembra, inclusive, que, com o início da temporada de turismo no país europeu em abril, os segmentos de hotelaria e de restaurante vão demandar muitos trabalhadores. Aqueles que tiverem cursos específicos saem na frente na disputa pelas vagas.
O cearense Francisco Diego, 39, está confiante. Ele optou por fazer um curso na área de hotelaria, para atuar na recepção de hotéis. “É uma formação que abre os horizontes, com muitas possibilidades profissionais”, diz. Ele conta que escolheu Portugal para fazer o curso profissionalizante devido à proximidade cultural e linguística com o Brasil e, também, pela perspectiva de empregabilidade na área em que quer atuar. Somente no Algarve, uma das principais regiões turísticas do país europeu, há milhares de vagas em aberto. “Com o curso, poderei procurar empregos com mais qualidade e de forma legal”, emenda.
Também do Ceará, Uriel Remígio Mota, 34, está apostando que, com o curso profissionalizante para auxiliar de fisioterapia e massagem, conseguirá dar um salto importante na vida profissional. Hoje, ele concilia as aulas com o trabalho de garçon em Lisboa. A escolha do que estudaria veio depois de uma boa consultoria. “Isso agilizou o processo de chegar ao curso que melhor se encaixava no meu perfil. Além disso, pude sanar todas as dúvidas sobre a escola, a parte jurídica e a autorização de residência”, relata. Mota, que está em Portugal desde o ano passado, vê a formação profissional “como um farol que nos orienta, como imigrantes, a seguir um caminho” sem grandes atropelos. “Sem orientação, ficamos perdidos.”
Na visão da niteroiense Mariana Nogueira, uma das principais vantagens dos cursos profissionalizantes em Portugal é que os diplomas valem em toda a União Europeia. Ou seja, é possível buscar emprego em 27 países que integram o bloco econômico. É importante ressaltar que a maior parte da região sofre com o envelhecimento da população, abrindo uma avenida para estrangeiros com boa formação. “Quero muito uma carreira internacional”, afirma ela, que fala francês fluentemente. “Isso me qualifica muito”, reconhece, lembrando que, logo no primeiro dia que chegou a Portugal, arrumou emprego em um restaurante.
Mariana, que se matriculou na MasterD, está cursando técnicas de desenvolvimento na web, que tem uma frente ampla de atuação. “Confesso que fiquei um pouco em dúvida, pois tinha um curso sobre administração de recursos humanos que me chamou a atenção. Ao contrário do Brasil, onde o RH é um departamento dentro de uma empresa, em Portugal, há firmas especializadas que prestam esse serviço”, ressalta. Nada impede que, mais à frente, ela faça uma nova especialização, já que os cursos são muito flexíveis. Parte das aulas pode ser feitas on-line, e, dependendo da disposição do estudante, a conclusão ocorre antes do previsto.
Renata, diretora da Academia e-Futuro, destaca que, no caso da escola em que atua, há uma representação no Brasil, o que permite que as aulas possam ser feitas no país enquanto a documentação para a mudança para Portugal é organizada. Ela assinala que os cursos mais procurados hoje são os de assistentes de marketing administrativo digital e de assistente de fisioterapia e massagem — nesse caso, os formandos podem trabalhar em clínicas de fisioterapia, em clubes esportivos, em hotéis e de forma autônoma.
Segundo Karol Ximenes, o perfil dos alunos de cursos profissionalizantes é diversificado, com predominância de pessoas com idade entre 30 e 40 anos, que, na maioria dos casos, estão no mercado de trabalho, mas querem dar um upgrade nas carreiras ou mesmo mudar de ramo de atuação. “Como esses cursos não têm a burocracia de processos seletivos, tudo fica mais fácil. Outro ponto relevante é que as escolas especializadas funcionam o ano todo, com mentorias on-line para tirar dúvidas”, diz. Vale ressaltar que os estágios não são remunerados, o que exige um planejamento financeiro por parte de quem pretende mudar de país. Será preciso uma boa poupança para se manter em Portugal enquanto o emprego não chega.
Cuidados nas escolhas
Para Marcelo Rubin, sócio do Clube do Passaporte, os brasileiros estão acostumados com cursos profissionalizantes, por isso, muitos têm optado por esse caminho para entrar legalmente em Portugal. “Uma das vantagens é que esses cursos são bem mais baratos que os de nível superior. Mas é importante ficar atento para que as matrículas não sejam inferiores a 12 meses, pois esse é o prazo mínimo para se ter o visto de estudante, que permite residência e trabalho”, afirma. “Mais: os empregadores reconhecem a eficácia desses cursos, o que garante uma empregabilidade maior”, acrescenta.
Rubin lembra, porém, que há outras formas de se ingressar legalmente em Portugal para viver e trabalhar. No fim do ano passado, por exemplo, o governo português abriu a possibilidade de cidadãos da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), entre eles o Brasil, de obterem um visto especial que garante permanência em território luso por até 180 dias. Nesse período, as pessoas podem procurar trabalho formal. Mas há necessidade de apresentar capacidade financeira de se manter em Portugal nesses seis meses de validade da autorização de permanência. Caso consigam uma colocação, ganham o direito de continuar no país.
Desde segunda-feira, entrou no ar um sistema on-line do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) que também beneficia cidadãos da CPLP. Todos aqueles que já estão em Portugal e pediram, entre 2021 e 2022, autorização de permanência no país por meio da chamada manifestação de interesse estão tendo a situação regularizada automaticamente. A previsão da Embaixada do Brasil em Lisboa é de que ao menos 100 mil brasileiros sejam beneficiados, saindo da situação de vulnerabilidade em que se encontram hoje.
“Com todas essas opções, é importante entender as necessidades de cada pessoa. Tudo deve ser feito com muito cuidado”, recomenda o sócio do Clube do Passaporte. Portugal desponta como objeto de desejo de muitos brasileiros. Contudo, há várias condições no meio do caminho para serem seguidas. Sem um bom planejamento, o sonho de uma vida melhor no exterior pode se transformar em pesadelo. A língua favorece, mas tudo está muito caro em território luso, especialmente, moradia. Cautela, portanto, é fundamental.
Fonte: Correio Braziliense
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